11 de março de 2009
N° 15904 DAVID COIMBRA
Ruy e Lauro, os inventores do futebol gaúcho
O futebol gaúcho foi inventado por Ruy Carlos Ostermann e Lauro Quadros, nesta ordem. Primeiro o Professor, depois o Lauro. Lógico, houve uma fonte de dentro do campo na qual o Professor bebeu. Era Oswaldo Rolla, o Foguinho.
Foguinho foi o primeiro técnico a pregar o chamado futebol total. Foi o primeiro a exigir preparação física dos jogadores. Montou um Grêmio que venceria 12 de 13 campeonatos.
Por essa época, o Professor saía do jornal e percorria a pé a Rua da Praia para ter com Foguinho na alfaiataria em que ele, Foguinho, trabalhava. Conversavam durante horas, barrigas encostadas ao balcão, o Professor fascinado com as ideias do velho técnico.
O Professor deu lustro às ideias de Foguinho, organizou-as em uma teoria coerente e com essa teoria fundamentou um novo estilo de comentário esportivo de rádio, um comentário em linguagem culta, de formato circular, que galvanizava os ouvintes.
Lauro enveredou por outra senda. Lauro fazia um comentário popular, sim, mas criativo. Para o Lauro, o jogador não fazia cera: “amorcegava” o jogo.
O Professor e o Lauro usavam linguagens diferentes para expressar a mesma ideia: o futebol de marcação, de dedicação, de empenho, de jogadores concentrados e profissionais. O Professor, mantendo sua elegância, nunca chegou a desdenhar abertamente do futebol alegre professado pelo resto do Brasil. O Lauro, sim. O Lauro identificou os “outros” como “os cariocos”.
Assim, havia dois “futebóis” no Brasil: o futebol “brasileiro”, de virtuosismo indolente, e o futebol gaúcho, prático, de resultados, de marcação implacável e obstinação farrapa. Esses conceitos foram disseminados pelos talentos dessemelhantes de Ruy & Lauro.
Tão articulados eles eram, tão convincentes, tão diferentes de tudo o mais no rádio brasileiro, que os outros comentaristas os imitavam, ao mesmo tempo em que os odiavam. Raros foram os que trilharam caminho original, como Paulo Sant’Ana. Quase todos são filhos de Ruy & Lauro, embora sejam filhos rebeldes.
O discurso de Ruy & Lauro aproximava-se de tal maneira a um dogma que eles conseguiram transformá-lo numa verdade nacional. O futebol gaúcho, na verdade uma mera abstração, é reconhecido pelo Brasil inteiro.
Todo mundo, no país, joga da mesma forma. Todo mundo tenta marcar, ocupar espaços e sufocar o adversário. Até os cariocos do Lauro jogam assim. Mas essas características só são reconhecidas quando praticadas por um time gaúcho. Que mágica poderosa possui a verve de Ruy & Lauro, capaz de forjar a identidade de uma nação!
A fórmula do sucesso
No final dos anos 60, os mandarins tomaram o poder no Inter e, também inspirados em Foguinho, formularam uma regra muito engenhosa para escolher os jogadores que fariam parte do grupo colorado.
O jogador tinha de ter duas de três características: força, velocidade e habilidade. Podia ser habilidoso e forte, habilidoso e veloz ou forte e veloz, jamais só forte, só habilidoso ou só veloz. No entanto, e isso os mandarins não disseram, não se faz um grande time sem uma maioria de jogadores habilidosos.
O problema é que o sucesso dos fortes e velozes iludiu os menos iluminados. Há quem acredite que é possível armar um time campeão apenas com operários. Não é o que mostra a realidade.
Os times vencedores da Dupla Gre-Nal sempre foram constituídos por grandes jogadores. De León, Oswaldo, Caju, Mario Sérgio, Tarciso e Renato no Grêmio campeão do mundo de 83; Fernandão, Pato, Alex e Iarley no Inter campeão do mundo de 2006; Figueroa, Falcão, Paulo César, Lula e Valdomiro no Inter dos mandarins;
Arce, Emerson, Carlos Miguel, Paulo Nunes e Jardel no Grêmio de Felipão; Gessy, Juarez, Aírton, Calvet e Vieira no Grêmio de Foguinho; Nena, Carlitos, Tesourinha, Villalba e Adãozinho no Rolo Compressor. Não existe time bom sem bons jogadores. Não há futebol, por gaúcho que seja, capaz de desmentir essa verdade.
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